Junho 2005

A festa do santo padroeiro da minha cidade é sempre um evento que me alegra. Apesar das circunstancias e de não ser propriamente a euforia do passado, pois já não tenho pernas nem disposição mental para isso e portanto acedi com satisfação aos apelos de um um arraial de S.João mais ao género de private party.

Por entre a comezaina, que incluóa as obrigatórias e dispendiosas sardinhas frescas assadas na brasa, vi-me numa sessão new age de adereços, que muito embora dispensasse os obrigatórios martelinhos e alhos porros, não deixou de ser divertida, dado essencialmente a uma companhia primorosa. Regue-se a vinho à descrição e temos quase toda a ementa de uma noite bem passada.

Contudo la creme de la creme, foi quando se viu chegada à hora pirótecnica hard core, em que eu a contra gosto participei, não sem ter emitido uma quantidade desmesurada de impropórios mentais, bem silenciosos. Não gosto do cheiro da pólvora nem dos estouros de rojões, nem de fogos de desartificio. Parecem-me uma maçada perigosa e uma forma de queimar dinheiro a custo de alguma adrenalina primordial algo caduca.

Mas mea culpa, mea tão grande culpa, pois fiquei com um sorriso de orelha a orelha quando os balões de papel se alinhavam para o enchimento e lançamento em condições climatéricas desfavoráveis. O balão de S.João tem na sua essência algo de sublime, é uma espécie de programa espacial da populaça que envolve tecnologia do século XVIII. É um imaginário poético de iluminar os céus na imaginação de para onde viajara tal engenho. Lançar um balão não é simples e requer alguma colaboração e entre ajuda entre quem acende e quem segura a máquina, para que o ar quente a possa elevar, rumo a um desconhecido. Apesar de haver uma tentativa que culminou em insucesso devido a um lançamento prematuro, vimos vários que subiram acompanhados dos efémeros e breves gritos de alegria dos balonistas amadores.
Estou a ficar perito…

O solstício de Verão teve em mim um grande impacto. Dei-me o direito de pequenas excentricidades que me deram imenso gozo.

O dia mais longo, pareceu-me até bem curto. Logo após a jornada de liberdade pós-laboral, descendo vertiginosamente a linha de metro, rumei à praia para um por do sol assombroso. De um vermelho rasgado de sangue o astro-rei descia ao passo que os inspectores faziam a sua pescaria anual de navalheiras por entre as rochas. Não resisti a umas palavras de incentivo e deixei-me banhar no mar fresco e límpido no meio dos rochedos. Se não anoitecesse já por ali teria ficado de molho…

E quando a estrela da tarde brilhava intensamente, e a lua cheia confirmava ser um dia mágico, dei por mim extasiado e feliz por estar vivo. Algo que não tem necessidade de explicação causa-efeito, apenas se sente, porque a Vida é feita de pequenas coisas que nos aquecem o coração. Basta que os queiramos sentir. Bastam gestos, momentos, ou as vezes palavras amigas para os tons cinza serem de um colorido tropical.

Normalmente ão seria tão difícil acordar de manhã. Mas a história repete-se, nesta altura do ano. Deve ser o meu ritmo biológico a entrar no seu costumeiro ciclo noctívago ou algo semelhante.
Apenas me apetece dar um tiro no despertador que berra solitariamente durante uma hora. E só quando se finalmente este se cala, dou por mim atrasado e desperto a contragosto, ainda a praguejar que sonhava erradamente que era Sábado.

O meu calendário mental nunca se acostumará ao fim da Primavera. Deve ser defeito de fabrico com certeza.

Captar um momento é uma arte. Por isso a fotografia é algo que me começa cada vez mais a despertar o interesse apesar de o meu domínio da técnica seja inexistente.
Contudo algo me reforça ao tentar agarrar um momento efêmero, um pedaço de luz e cor que fogem e que são únicas. Nenhum raio de luz, nenhum sopro do vento, nenhuma nuvem, se repetem, exactamente naquele lugar, naquelas circunstãncias.

Segurar uma câmara fotográfica é como tentar aprisionar para a eternidade um facto, um retrato ou paisagem singulares. Assim podemos possui-los para sempre. Tentamos roubar da erosão do tempo algo irrepetível. Trata-se de uma vertigem enganosa, mas tambêm uma espécie de aproximação ao divino imutável – quase um sentimento religioso.

Por isso dou comigo a pensar em ângulos e luz e a suspirar não ter a minha companheira prateada à mão de semear como um turista japonês!

Arigato-san!

I read it in a magazine
I don’t wanna see it again
I threw away the magazine
And looked for someone to explain
I don’t wanna look back
I can’t look around
I don’t wanna see it coming round

Listen to the ups and downs
Listen to the sound they make
Don’t be scared when it gets loud
When you’re skin begins to shake
’cause you don’t wanna look back
You gotta look tall
You gotta see those creeps crawl

I know you know
I know you know

I can see you’ve got the blues
In your alligator shoes
Me, I’m all smiles
I got my crocodiles
I don’t wanna look back
I can’t turn around
I don’t want to see it coming down

Met someone just the other day
Said wait until tomorrow
I said, hey what you doing today
He said, I’m going to do it tomorrow
Met someone just the other day
Said wait until tomorrow
I said, hey, what you doing today
I’m going to do it tomorrow

A cada dia que passa, redescubro velhas amizades que tinham sido edificadas em betão armado, e que julgava injustamente perdidas.

Fotografar a minha cidade, deu-me há tempos um renascimento espiritual, de observar a beleza das coisas porque passamos todos os dias e não lhes damos o devido crédito. Ver com olhos de ver, as linhas que embelezam o nosso quotidiano e não passar sem degustar com a visão a alma do espaço à nossa volta, atinge-nos. Faz-nos apreciar a beleza como um ser mais grandioso e agradecemos fazer parte desse ser, nem que seja pelo admirar.

Voltar a minha aldeia ancestral também se revelou uma abertura de horizontes perdidos. Perdi-me durante horas no esquecimento dos campos, sentindo a natureza rude e perfeita. O verde no granito e o granito borbulhando do verde, a perder no campo de visão, levaram-me a percorrer montes e vales, ansiando sempre por ficar sem respiração assim que atingia um cume mais distante. Reflecti e encontrei minhas raízes algures naqueles campos, chegando mesmo a ter naquelas rochas da Raia, Portugal num pé e Espanha noutro. Absorvi os cheiros e ruídos da minha herança.
Depois senti-me renovado. Capaz de prosseguir.

O que eu julgava ser uma fase de travessia do deserto, tornou-se rapidamente num oásis muito amistoso. A Vida tem fases que nos encaminham para terrenos que nem sempre são os que queremos atravessar, mas reserva-nos trilhos alternativos.

Por vezes temamos em seguir por becos sem saída, batendo furiosamente com a cabeça num muro intransponível, pois achamos que voltar atrás no percurso é um retrocesso. Isso não é verdade, uma vez que há sempre uma encruzilhada que já passamos que podemos retomar e tomar outro caminho.

Não vale a pena insistir num caminho errado quando estamos perdidos. Mesmo num deserto… pois pode-nos levar a um oásis imenso em vez da morte na areia escaldante.

The kids are freed, now all they need is a gift from their mum and dad
They heard the tones, of Spanish phones stranded in the sand.

You left on the lights, is there somebody home
You left on the lights, is there somebody home
Left on the lights, is there somebody home, light and magic

You cut your hair and made a friend, now they’re falling into you
This is the closest that you will get to them, how do you do?

You left on the lights, is there somebody home
Switched off your voicemail and left it alone
Left on the lights, is there somebody home, light and magic

Then lost some time in someone’s line, might just’ve caught the show
This is not real, but it will deal with this thing between tonight and
tomorrow…

By the beach in a one-storey building, you’re lucky if the light’s not out
But, baby, now you look like a Xerox of yourself.

The kids are free, now all they need is a gift from their mum and dad

Sentindo o vento zumbindo nas minhas orelhas, agrada-me a sensação de perigo, quando percorro a linha do neo-eléctrico que está a ser construída entre a minha cidade e a minha praia.

As obras ainda estão atrasadas, mas as lages mal assentes das valas permitem-me atingir uns ofuscantes 30 km/h numa largura de 70 cm durante quilometros. A adrenalina consome o passeio onde nem sequer posso tirar os olhos da frente enquanto pedalo freneticamente.

É uma sensação única de liberdade e risco. Um salto em falso e só no outro dia de manhã poderão ver os meus ossos todos quebrados. Mas não consigo resistir.